segunda-feira, fevereiro 20, 2006

O rio dos sonhos

O rio corria bem devagar, por entre curvas e sonhos ele corria. Azul, amarelo, branco, roxo, verde…os sonhos misturavam-se formando o arco-íris na superfície do rio. Os sonhos voavam por entre nuvens de formas desiguais, por entre o ar esquecido que atravessava aquele sítio. Sitio dos sonhos, diziam, com o rio dos sonhos. Os sonhos voavam e deixavam-se deslizar por um fio, para as águas calmas. Sonhos multicolores desciam sem serem reparados, mergulhando e deixando as águas cada vez mais pintadas.
Ele passava horas contemplando o rio, esperando pelo momento em que os seus sairiam das águas e se fizessem notar…Mas nada, tudo continuava tão quedo e mudo, desde que ele chegara. Apenas o barulhinho dos sonhos inquietos por saírem, apenas aquele barulhinho mesmo aos seus pés… parecendo quase tocá-lo, mas no fundo tão longe. Tão longe, porque os sonhos estavam mesmo no fundo, sobre uma película de vidro inquebrável…ninguém chegava lá.
Quando a noite chegava, ele recolhia o seu fio de pensamento, e levava-o até a sua casa, perto do rio dos sonhos. Por vezes, despertava do seu sono, com sonhos a pairar sobre a sua cabeça…levantava-se­­ e caminhava um pouco, caminhava e deitava-se junto da relva do rio, esperando, esperando…De cabeça voltada para um fundo azul escuro, voltava a desenrolar o seu fio de pensamento, e os seus sonhos. Os pontinhos luminosos diziam-lhe coisas ao ouvido, coisas que fazem chorar. Diziam que ele nunca iria ver um único sonho dele sair por a frincha do vidro…Diziam-lhe coisas ao ouvido, e ele pensava ouvir, mas não ouvia… Deixava-se estar um pouco mais sobre a relva, mesmo com pequenas gotas de água que caiam sobre si, mesmo com o vento que arranhava a pele e fazia os olhos chorar. E ele chorava, por causa da água que lhe caía, por causa do vento que lhe soprava nos olhos, por causa da película de vidro, por causa do fundo do rio, não dos sonhos, mas sim dos seus sonhos perdidos…
Acabava por adormecer na relva fria e húmida, e as pessoas chamavam-no louco. Louco por achar que estar ali condicionaria o desejo das águas…Louco, sussurravam, louco, gritavam, louco diziam as pessoas tal como os pontinhos do céu lhe diziam. Mas ele não ouvia, ou não queria ouvir…Continuou de pé firme, esperando, esperando, esperando…Quando todos se esqueciam dos seus sonhos, quando a maior parte desistia de sonhar, ele ali estava cada vez mais sonhador…
As manhãs, as tardes e as noites repetiam-se num constante esperar…Pensou desistir, esquecer como todos lhe diziam…mas numa dessas noites, em que se achava deitado na relva, sonhou…sonhou mais um pouco, e mais, e mais, e mais, e ainda mais, e ainda mais que o mais do ainda mais. Sonhos de uma vida, acumulados no extenso fio do seu pensar…Fio de pensamento que tinha linha, como novelos de lã, que se entrelaçavam uns com os outros e davam um gigante novelo de lã…assim era o seu fio de pensamento, e os seus sonhos cobriram-no todo, formando uma grande bola de sonhos…A bola flutuava pesada no ar, pisando as nuvens, pisando o ar com o seu monstruoso peso…O ruído não era leve, como os outro sonhos, era um rolar intenso, uma melodia desesperada de esperança e desejos…A bola pesava cada vez mais para o rio, cada vez mais, até que tocou na fina película, que cedeu um pouco…os sonhos não paravam de chegar, enaltecendo a grandiosidade da bola de sonhos. Estalidos, e fendas cada vez maiores a bola tentava encontrar os outros sonhos perdidos…Mais e mais sonhos, mais e mais estalidos e fendas…Estrondo…Vidros partidos, que voaram em todas as direcções, vidros que tocaram os pontinhos luminosos e os fizeram encolher…Pedacinhos de vidros que choviam por entre as cores dos sonhos que saiam velozes com o vento, que se espalhavam como setas que cortavam o ar, e se faziam notar, rasgando a vida do sonhador que sonhou…Sonhos tão belos e coloridos, só daqueles que fazem sorrir, fechar os olhos e abrir muito os braços. Só daqueles que fazem sorrir pela boca, pelos olhos, pelo nariz, pelas orelhas, pelos dedos…Só daqueles que nos fazem girar, e depois cair com gargalhadas…Só daqueles que sonhamos e procuramos como se fosse um tesouro muito grande…
E os sonhos fugiam, escapavam das águas do rio dos sonhos…e ele saltava vendo os seus sonhos colorir o céu, tornado-o tão belo e tão feliz…
Os sonhos escapavam e ele ria muito alto, saltando por entre a relva que esperou com ele por aquele momento. Os sonhos pintavam tudo, e as pessoas acordavam e também riam com ele, rodopiavam com ele, rolavam pela relva, cantavam, saltavam, gritavam sem saber porquê…Só sabiam que estavam felizes, e havia cor, e não havia mais rio que prendia sonhos…
Podiam colorir o mundo com sonhos bonitos, podiam pintar sorrisos, podiam sonhar...

3 comentários:

D. disse...

sonhar faz a vida mover... como um motor que impulsiona que se acorde. sonhar acordado, faz-nos levantar o corpo e ser alguém e tentar apanhar esses sonhps realidade... e lutar...

Anónimo disse...

Já dizia o poeta que o sonho comanda a vida. Eu sonho que tu nunca deixes de sonhar... Nunca desistas de sonhar... Mas tal como a personagem do teu texto às vezes há que ser persistente, lutar, contra tudo e contra todos, para que os nossos sonhos saiam do fundo do rio e se tornem realidade. E eu creio que tu serás como o teu personagem: tens mesmo que lutar muito para conseguir os teus sonhos. E no que eu puder ajudar... podes contar comigo...

Anónimo disse...

sonhos sao sonhos..e a vida é a vida..mtas vezes a realidade..pera..alias..na esmagadora maioria das vezes a realidade nao tem nd a ver c o k sonhamos e mtas vezes é exactamente o oposto dos nossos sonhos..

mas sonha k t faz bem sonhar..ao menos nos sonhos somos kem keremos e fazemos o mundo à nossa medida..pena k a realidade tenha tantos pesadelos..

continua a escrever assim!!bjinhus!!