segunda-feira, setembro 26, 2005

Enxerto de um abraço escrito

Às vezes tenho raiva de mim, (e é essa a única vez que me enervo a sério) porque não consigo demonstar-te, nem aos outros, os meus sentimentos...Ontem queria abraçar-te tanto!Queria chorar todo o meu carinho para cima de ti, molhar-te com as minhas lágrimas salgadas mas ao mesmo tempo doces, despojar-me de toda esta cápsula que me faz sentir a pessoa mais fria do mundo...mas eu tenho medo de me mostrar...queria que estivesses aqui comigo, para me embrulhares nos teus braços, e dizeres que apesar de tanta gente neste longo caminho, vamos ser e ter sempre nós as duas...vamos ter sempre as mesmas danças, sempre as infinitas conversas sobre assuntos sérios e assuntos sobre coisa nenhuma, vamos ter sempre as idas a casa uma da outra, vamos ter sempre aquelas aventuras....enfim, diz-me que vamos ter tudo isso para nós.
Neste momento uma e dez da manhã, um copo de água à beira, silêncio absoluto na sala, o resto das pessoas a dormir. O candeeiro ao lado, com uma luz ténue, e uma pessoa comovida pelas tuas palavras, tentando-se exprimir e retirar a sua cápsula. Sabes que te adoro, não sabes? Sabes que apesar de não te abraçar muito e de não te dar muitos beijos, o meu carinho fortificou-se mais e mais... todas as relações são assim. Sou estranha, sinto-me um bocado diferente de todos aqueles que não têm problemas em mostrar-se, mas o meu carinho fortificou-se. Só para te tirar as dúvidas, escrevo, e é certo que te adoro. Adoro a tua forma de dançar, a forma como falas, a forma como ris, a forma como coças o nariz, a forma como o teu cabelo arrebita nas pontas, e quão abundante é, a forma como separas os dedos dos pés, a forma como ouves e cantas música, a forma como bates com os dedos numa mesa, a forma como róis as unhas e canetas, a forma como olhas o mundo, a forma como olhas uma aventura, a forma como te sentas... adoro-te. Simplesmente.
Sinto que cada palavra mesmo os artigos têm um bocadinho de mim, um bocadinho do meu enorme carinho, um bocadinho do meu mundo, onde estão algumas pessoas que nem sabem que estão lá. Mas tu sabes...abri-te o meu mundo por inteiro, fiz uma cópia das chaves da porta, e por isso podes entrar sempre que quiseres. Podes sentar-te, podes rir, chorar, cantar, dançar, e eu saberei que estás lá dentro, vou observar , e rir, chorar, cantar e dançar contigo. Sabes que enquanto estiveres no meu mundo eu irei estar atenta, para que nunca te sintas sozinha e esquecida, mesmo que assim o pareça. Eu estarei lá, a rir ou a chorar contigo, triste porque estás triste, alegre porque estás alegre, e nada altera isso...
Ainda sinto a lágrima a querer sair, ainda sinto aquele abraço que demos e o beijo que depois me ficou marcado na bochecha. Apanhei o beijo com as duas mãos para não me escapar, meti-o no bolso para não o perder, agarrei o calor dos teus braços e meti-o no outro bolso. Está tudo bem guardado, eu vou coser os dois bolsos, aqueles bolsos são teus, não entra nem sai nada mais.
Uma e trinta e sete da manhã, um copo de água ainda cheio, o candeeiro a querer apagar, um avô que aparece sonolento e me acena, uma pessoa que sorri do outro lado, e que volta a concentrar-se no seu abraço escrito. Uma pessoa que se sente muito mais leve, com todo o seu carinho liberto, a cópia da chave do seu mundo entregue e olhos vermelhos, mas felizes. Uma pessoa com a memória mais livre, que é capaz de retornar ao passado e fazer as mesmas coisas com a mesma pessoa milhões de vezes como se fosse a primeira vez. Uma pessoa que espera o dia de amanhã, o dia em que a pessoa que a comoveu vai conhecer o outro lado do seu mundo, um mundo onde o ar é mais puro. Uma pessoa que boceja, concentrada no monitor, concentrada no seu teclado, e que quer reler os seus pensamentos por escrito do seu eterno abraço escrito.

A nuvem multicolor

Ela olhava o céu com um olhar concentrado. Os seus olhos castanhos observavam cada pormenor daquela estranha nuvem multicolor.
Com o seu narizito coberto de sardas de todos os tamanhos cheirava o perfume do vento, da relva, do céu, do sol... e mesmo o perfume suave daquela nuvem. Sorriu. Caminhou, os seus pés descalços tocaram a relva fresca e pousaram mesmo em baixo da nuvem. Viu um cordel mesmo por cima da sua cabeça. Sentia-o tocar levemente nos seus cabelos. Então, agarrou-o e puxou, puxou, puxou. A nuvem aproximou-se dela, aquela belissima nuvem multicolor. Finalmente tinha-a! E não a iria perder nunca mais! Atou o cordel ao seu dedo e caminhou, num passo certo e seguro. A nuvem multicolor, cheia de alegria, amor e amizade era finalmente sua...

quarta-feira, setembro 21, 2005

Escuro da loucura

Quando finalmente abri os olhos, encontrei a escuridão. Levantei-me de uma cama, sentei-me e o meu corpo acostumou-se ao negro.
De uma janela surgia uma luz ténue e difusa que dava ao quarto a luz necessária para distinguir as formas do quarto. Havia a cama, a janela, e uma mesa pequena com dois copos. Ao lado da mesa, uma porta de madeira, onde cheguei tropeçando em mim mesma. Coloquei a mão no puxador. Estava fechada. Olhei em volta. Não existia nada mais...
Aninhei-me sobre mim mesma, esfregando os olhos, desgrenhando o cabelo. Coloquei a cabeça entre os joelhos. "Estou sozinha, num quarto escuro", pensei.
- Não estás sozinha...- disse uma voz- "...estamos todos aqui..."- disse uma voz de mulher-"...os teus demónios!" Riram em uníssono, espalhando o terror na minha pele. Nada se via, apenas se ouvia risos abafados. Mas a pouco e pouco, as formas no escuro tinham forma e volume. Quatro olhos, dois narizes, duas bocas distinguiam-se, e corpos escanzelados aproximavam-se de mim. Cada um segurava algo nas mãos. A mulher segurava uma faca,e o homem um machado. As vozes deles estavam em mim, bem dentro de mim, sibilando, mas gritando ao mesmo tempo.
Matar...nós...vamos ...te MATAR!
Corri para a porta, e gritei de terror. Matar...agarrei o puxador com mais força e voltei-o...nós...bati na porta...vamos...ouvi a minha voz quase muda...te...Eles querem-me...MATAR!
Eles puxavam-me agarrando as minhas pernas, lutei para me voltar e pontapeá-los, mas não consegui...a mão do homem agarrava-me..." Não consigo, vão-me matar..meu sangue..." As minhas unhas cravaram-se na madeira apodrecida da porta, mas escorreguei e senti lascas penetrarem a pele. Soltei-me da porta. Virei-me e encontrei os olhos deles, vermelhos raiados de sangue, talvez meu sangue, o riso sair e vaporizar o ar, queimá-lo e deixar-me privada dele, estava a sufocar...Os meus gritos e aqueles risos cobriam o quarto.
Do outro lado ouviram-se passos, passos apressados. Ouvi o meu nome, mas não respondi. Gritei apenas. Terror, medo, dos meus olhos brotavam lágrimas. Eu ia morrer. Os meus demónios, as vozes na minha cabeça, dentro dele, em cada neurónio, a morte. Lutei contra eles. Arranquei a faca daquela mulher...golpes profundos nos olhos, na boca, no nariz. O homem observava a cena a sorrir-me deleitando-se.
Abriu-se a porta. A luz entrou repentinamente no quarto. A mulher afastou-se segurando a cara com as mãos...o homem a sorrir.Uma mulher entrou no quarto agora iluminado. Os seus olhos expressavam terror. O quarto estava destruído, não restava nada inteiro.
Ela tentou aproximar-se de mim, mas fugi-lhe e sentei-me num canto do quarto
-Eles estão ali, eles queriam matar-me...eles iam...meu sangue...- murmurei entre dentes. A voz calma da mulher ouviu-se:
- Eu sei...está tudo bem, tudo bem..."
A voz aquietou-me. Comprimi a cara nos joelhos e baloicei-me. Não estava muito certa.
-...eles vão-me matar...
Ela aproximou-se, tomou o meu braço, olhou as minhas mãos com unhas desfeitas, olhou a minha cara com sangue seco, olhou-me nos olhos.
- Descansa...
Olhei a cama onde antes estavam os demónios. Estava vazia. Os olhos fecharam-se pesadamente. A mulher sorria-me muito longe. Não se via nada, não se ouvia nada. Pouco e pouco o silêncio voltou, e a escuridão reinou dentro de mim outra vez, calma e escura...

terça-feira, setembro 20, 2005

Olhos distantes, corpo longínquo. Ali estava ela. Enterrada a meio da cintura, com olhos postos num céu clemente. Olhos negros, pretos de escuridão, pretos de nada. As mãos comidas pelos ventos, apontavam o céu, num acto impossível de agarrar.
Lá em cima o céu, azul, com o sol radiando energia para toda a terra, aquecendo e protegendo todos os rebentos que pudessem germinar. O sol aquecia todos, menos ela. Nela estava uma sombra, ausência de sol. À volta luz, nela sombra. à volta crescimento, ela a definhar. A cara era branca, transparecendo todas as veias e artérias, lábios cerrados prendendo o grito e a vontade de gritar. Ela branca e escura. Ela calma e feroz.
Os olhos percorriam o céu, pedindo para que ele a visse, também estava no mundo, metade no mundo, metade na no interior do mundo.
Era cada vez mais puxada para o fundo, cada vez mais um resto de alguém que uma vez fora iluminada. Mas o céu, o sol não estavam ali para ela. Teria de lutar. Teria de chegar por si própria ao céu, como se fosse um papel e dizer: "É meu!"
Teria de lutar...teria de puxar um bocado de sol para a iluminar, para crescer e sair do buraco do mundo.
Agora era só ela e o mundo. Era só ela e um voo para além do céu.

Quadro

Não era assim que imaginava o meu quadro. Uma praia, com o mar calmo, mas com ondas que chegam aos pés em forma de espuma. Também esperava o céu mais claro, sem muitas nuvens, para poder observar. Não era com este quadro que me queria partir em milhares de particulas cheias de espectros, cheios de sombras, falhas, cheiros, vozes, pessoas... cheias de todo esse nada que não me é nada e nem quero que me seja alguma coisa.
Sinto a espuma cada vez mais gelada, deito-me na areia, deixo a espuma lember o meu corpo. Deixo as particulas cheias lamber a mente. Não há nada que eu deseje nestas particulas cheias, absolutamente nada. Os espectros deixá-los-ei nas sombras, que se encontram nas falhas. Os cheiros e as vozes pertencem às pessoas...nada me são. Deixá-los-ei.
O frio percorre os restos de mim, mas nada disso importa realmente. Fundi-me na areia, não distingo o que é meu, do resto do quadro, apenas memórias, memórias frias esbatidas pelo sofrimento, só distingo a morte no meio deste quadro;O céu que se fecha sobre mim, as nuvens agora negras...a morte é o que me resta, entregar-me ao nada, atirar a vida para o fim, cuspir a alma pela boca, sair todo o peso deste corpo inútil, de pessoa inútil, num mundo inútil. Desisto de tudo, que a água me engula, que as lembranças se afoguem no turbilhão de mar, mar dos perdidos.
Descolo o corpo da areia. Recorto os braços e as pernas, recorto a cabeça, destaco-me ali. Levanto-me. A água escorre, escorre em gotas pelo meu corpo, serão estas as lágrimas que nunca irei chorar?Pequenas gotas caiem do céu, as ondas tocam o céu. Vou caminhar até até chegar à linha que separa os dois azuis. Quero caminhar, andar, encher o peito daquele cheiro a mar, inspirar, expirar a liberdade que não tenho, o amor que nunca tive. Não tenho nada, e por iso caminho. Não sou nada, e por isso sou aquela que caminha com a água na boca. Continuo a caminhar, não vou parar agora, tão perto estou, posso tocar a morte. Sinto a água entrar no nariz, na boca, na garganta, afogar os pulmões, encharcar o coração...estou mergulhada,existo, mas estou por um fio.Não me consigo mover, estou ali a ser puxada para o fundo. Parti-me em particulas, cheias de água, sou parte do mar, e não me vou recortar nem destacar nunca mais...

Ouve-se...

Ouve-se um piano no fundo,
a música devagar,
corre no ar,
à espera do mundo.

Ouve-se os dedos na chuva a deslizar,
acariciar as gotas,
por entre mãos rotas,
que tentam agarrar.

Ouve-se um pincel,
uma mão a pintar,
as ondas do mar,
presas num papel.

Ouve-se uma voz,
um eco mudo,
refugiado nem escudo,
tão perto e tão sós...

Para a minha pele...

A pele,
um bocado de mim.
A vida,
marcada em mim,
em cada pedacinho de pele,
uma traço, uma fenda,
uma cicatriz, uma ruga.
Cada história...
Marcas leves,
histórias passageiras,
histórias engraçadas,
paixonetas ligeiras,
por alguém...
Marcas profundas,
um desgosto do tamanho do mundo,
um grande alguém perdido,
um grande amor amanhecido,
no peito, num segundo...
A pele,
um bocado de mim,
que sente,
que chora,
que vive por mim,
que sente,
que chora,
pelas histórias de uma vida...

sábado, setembro 17, 2005

Queria exprimir-me...

Queria exprimir-me. Queria exprimir o que sinto ao ouvir esta música. Queria exprimir o que sinto ao ver o mar. Queria exprimir o que sinto ao ver o céu e o sol. Queria exprimir-me em palavras. Palavras soltas, com ou sem sentido, poemas, textos, mas seriam minhas as palavras, minhas...
Por este desejo de me querer exprimir criei este blog para tentar expressar-me, e expressar tudo o que vejo, expressar sentimentos e tudo isto para partilhar tudo isso convosco.