sexta-feira, março 17, 2006

Ela

Observo-a a dançar. Pequena e frágil, por entre o vestido branco e suave, que lhe cai pelo corpo. Os braços são levados por uma pequena brisa que corre, parece que escorrem no ar. Ao fundo a melodia de um piano, que toca desorientado, procurando as notas. As teclas batem sem nexo, mas ela faz da música algo compreensível. Faz da dor do piano sua dor, e faz da minha dor algo tão estulto. E ela sabe que me faz sentir assim, por a observar. Tão longe, mas quase que consigo sentir o seu respirar ofegante do esforço dos movimentos certos e delicados. Quase que consigo sentir o seu coração pulsar o sangue que chega às suas longas pernas, aos seus braços pequenos que me tocam sem saber. Bela ela. Bela dança.
Nas mãos seguro o punhal, decidi matar o meu amor hoje. É que embora sinta o amor, não tenho, não quero e não posso dar amor a ninguém. Sou um animal estranho, que se esconde no ódio para encontrar a salvação, e por isso vou matar o amor de uma vez por todas. Sim. Não tenho, não quero e não posso dar amor a ninguém, porque o amor existe em mim em poucas quantidades, e se te oferecer a ti, posso começar a odiar-me a mim. Perdoa-me meu amor, mas tenho de te matar. Sou eu, ou tu. E eu escolhi-me a mim, porque eu sou eu., porque eu me pertenço e tu danças e escapas-me por entre esse vestido fugidio.
Levanto-me. Seguro o punhal. Vejo os teus olhos seguir o meu movimento. Sorris para mim, chamas-me com a tua mão, pedes-me para dançar contigo. Eu estendo-te a minha mão trémula, e sinto o meu amor soltar-se todo para ti. Tu escorregas no meu amor liberto, a minha mão estende-se para te agarrar. Mas, o punhal! A mão que te ia segurar o ventre, segurava o punhal…o punhal…o punhal atravessou a tua pele, os teus músculos e o sangue saiu, vermelho como o meu amor…O punhal e o meu amor, o punhal e teu sangue, meu amor! Caíste de vez…com um baque mudo e seco. O teu vestido branco feito de nuvens, vermelho…a tua pureza desfeita no sangue, o teu ventre cortado, o vestido da cor dos teus lábios, e os teus lábios, antes vermelhos, da cor do vestido…Desgraçado punhal! Desgraçado amor! Desgraçado eu! Queria matar o meu amor, e agora que o queria dar, o meu amor matou-se...
Seguro-te nas minhas mãos, e coloco um beijo morto nos teus lábios, uma última réstia do meu amor… Ofereci-te o meu amor e morreste-me, agora só tenho ódio em mim…O piano ainda continua a tocar sozinho, o escuro instalou-se aqui neste lugar, e eu sou a escuridão completa. Procuro pelo som o piano, e encontro-o não muito longe de ti. Tento ser compositor e compor uma música para ti. Encontro as notas, e sei fazer melodia, mas tu já não danças amor…morreste-me, e eu morro…


3 comentários:

Anónimo disse...

um bocadinho pessimista o texto =p n ker dixer k esteja mau, pelo contrario ..continua a escrever assim =) bjinhos!!

D. disse...

e o amor voltará a renascer num beijo ao despertar... as raízes de um amor que cresceu sem avisar... porque somos feito do amor e do amor que queremos dar...

Anónimo disse...

Às vezes é preciso matar um amor para se viver outro. Melhor e mais pleno...